Portal de notícias traça raio-x das problemáticas dos professores da rede privada
Trabalho realizado pelo Sindicado dos Professores de Alagoas (Sinpro/AL) é destaque em matéria publicada pelo portal de notícias Cada Minuto. Confira a matéria na íntegra: http://www.cadaminuto.com.br/noticia/286877/2016/05/12/professores-de-escolas-particulares-enfrentam-dura-realidade
Informalidade, condições insalubres, falta de recursos, assédio moral, atraso salarial, desvio de função; o não pagamento de férias, horas extras, INSS, FGTS e 13º salário, além do excesso de alunos em sala de aula e de outras situações que não dignificam o trabalho de um profissional e que levam a doenças e inseguranças são problemas enfrentados diariamente por vários professores de escolas particulares de Alagoas.
Os itens citados representam 90% das denúncias recebidas pelo Sindicato da classe. Alguns professores vêm sofrendo e adoecendo calados com medo de represália, outros tomaram coragem para apresentar suas mazelas, o que fez o Ministério Público do Trabalho (MPT), o Sindicato dos professores da Rede Privada (SINPRO) e o Centro de Referência a Saúde do Trabalhador (Cerest) entrarem em ação.
Segundo a professora J.S., que usamos apenas as iniciais de seu nome, pois ela teme ser identificada, a situação é crítica nas escolas em que trabalhou. Por questões de ameaças, ela solicitou que não informássemos os nomes dessas instituições de ensino na matéria.
“Nós éramos submetidos a exercer outras funções, como lavar e decorar a escola, em horários diferentes da nossa jornada e sem receber nada por isso. Além disso, quando estava escrevendo no quadro e um aluno cometia algum ato de indisciplina, eu que recebia a culpa. Se terminasse a aula dois minutos antes, era acusada de roubar o tempo”, desabafou a professora.
Em busca de soluções e melhorias, o Ministério Público do Trabalho, SINPRO e o Cerest estão desenvolvendo um procedimento promocional, o Promo, que visa a saúde e qualidade de vida do professor, por meio da conscientização, análise de documentos, inspeção e capacitação.
“A educação se faz na melhoria contínua da saúde e segurança do trabalhador. Mesmo porque quando um trabalhador sofre uma doença ocupacional ele pode entrar com ação trabalhista contra a instituição e, geralmente, ele ganha. É uma questão de prevenção, pois é o trabalhador que vai sofrer o dano à saúde. O estabelecimento tem a obrigação já que gera o risco, de fazer a promoção da saúde”, esclareceu o engenheiro do trabalho do Cerest, Paulo César.
O Erro é seu!
De acordo com a professora J.S., até hoje ressoa em seus ouvidos, uma das frases mais ditas pelos diretores: “O Erro é seu!”. Alguns constrangimentos aos quais foi submetida e lhe abalaram emocionalmente.
“Diante da turma, eu, por exemplo, fui muitas vezes submetida a ouvir duras críticas e até gritos, além de ter de assumir erros dos quais não era culpada. Cheguei a sair chorando da sala de aula e ter dificuldade de retornar a dar aula na turma”, relatou a professora que demonstra um misto de sentimentos a cada palavra que emite sobre o assunto.
Saúde vocal
A combinação da falta de recursos e do excesso de alunos em sala de aula é danosa a saúde vocal dos professores. J.S. contraiu micronódulos nas pregais vocais.
“Todas essas situações quase me fizeram desistir da sala de aula. E o fato de eu ter adoecido quase me fez perder de assumir um cargo em um concurso público e de poder trabalhar em outras escolas”, expôs J.S.
A fonoaudióloga Francimar Xavier explicou que essa condição inadequada pode causar sérios problemas.
“O ambiente com muitos alunos e a falta de microfone forçam o professor a falar no tom mais alto, para poder competir com os barulhos e ser ouvido por todos. O que causa disfonia, que é a rouquidão, além de cansaço para falar e até dor. O desgaste na prega vocal associado a outros fatores como álcool e fumo podem levar ao câncer. Muitas vezes por questões da saúde vocal, o professor precisa até se afastar da sala de aula. A escola precisa favorecer a preservação da voz do professor”, disse a profissional.
Ergonomia
“Outro problema que enfrentamos é que as escolas estão tirando as cadeiras e os birôs dos professores, o que nos obriga a ficarmos horas em pé, sem nem ao menos podermos guardar os nossos pertences ou ter apoio para fazer a chamada dos alunos”, relata também J.S.
Segundo o terapeuta ocupacional Alinthon Fagner, essa situação e outras atividades laborais podem ter reflexo em todo o cotidiano do professor, interferindo ou limitando em tarefas simples.
“Uma das fases do Promo é a questão da ergonomia que se preocupa com as condições gerais de trabalho. Vamos avaliar tudo, como a disposição e falta de equipamentos e recursos, e, assim, motivar que haja as adptações necessárias, resgatando os papeis dos professores ocupacionais em todas as suas áreas de desempenhos de vida”, expôs.
Mera mercadorias
Muitos professores estão se sentido como mercadorias, sem valor e importância, é o caso do professor L.F., que também não quer ser identificado para não perder seu emprego.
“O que eu ouvi de diretores diferentes e que me marcou muito foi a seguinte frase: o aluno traz dinheiro e o professor leva o meu dinheiro. Isso é a prova de que o ensino particular está totalmente mercantilizado e o trabalho do professor está subjugado”, disse o professor.
“Para aumentar os seus lucros, o que é direito do professor é tirado em favor do lucro da instituição. Espero que os diretores e gestores das escolas percebam que não vale a pena desrespeitar à Legislação em favor do lucro, em detrimento da saúde dos professores”, expôs o presidente do SINPRO, Eduardo Vasconcelos.
Carga excessiva de trabalho
Por conta de receberem abaixo do piso e da necessidade financeira, muitos professores se submetem a uma carga excessiva de trabalho.
“Ano passado eu trabalhei os três turnos, de segunda a sábado, e ficou ainda mais cansativo no período do vestibular. Hoje minha maior alegria é porque tenho duas noites de folga. Mas, o professor para poder ter uma renda boa e viver com um mínimo necessário, precisa dobrar muito sua carga horária. A questão é que, além disso, o professor ainda tem que dar conta dos serviços extraclasses como elaborar e corrigir provas. Então, a gente termina vivendo em função do trabalho. Feriado e domingo, dificilmente, um professor pode aproveitar”.
Sem recursos
A direção das escolas cobra dos professores que realizem aulas mais dinâmicas, mas a falta de recursos dificulta que isso aconteça.
“O professor precisa ter estratégias e dinâmicas para ensinar, deve buscar sempre melhorar sua metodologia, mas, lamentavelmente, as escolas não viabilizam recursos tecnológicos e financeiros para isso. Muito menos apoio”, disse L.F.
Reação das escolas
Alguns diretores não reagiram bem ao saberem que foram escolhidos para o Promo, porém outros a enxergam de forma positiva, este é o caso do diretor do Instituto Educacional Pajuçara, Manuel Messias.
“Eu achei uma iniciativa ótima, principalmente para aqueles que querem trabalhar dentro da lei. A gente está correndo para adequar o Instituto a todas essas situações dentro do prazo que nos foi concedido”, declarou o diretor.
A presidente do Sindicato dos Estabelecimentos de Ensino no Estado de Alagoas (SINEPE/AL), Bárbara Heliodora, reforça que a lei deve ser cumprida.
“É bom que se esclareça que nem todas as escolas estão desrespeitando o direito dos professores. Como presidente do sindicato que representam as escolas, eu sempre oriento que elas ajam dentro da legalidade. Não admitimos que nenhuma escola não atenda ao direito do trabalhador, entre eles o professor. A escola é uma empresa e como empresa deve atender aos direitos estabelecidos, como os da CLT”.
Penalidade
O procurador do Trabalho Rodrigo Alencar explica as conseqüências para as escolas que não se regularizarem.
“Caso a escola não colabore na promoção do bem estar dos professores, ela fica sujeita a responder a um inquérito civil. Ela pode ser investigada por nós, Caso ela continue resistente, ela será acionada judicialmente, vamos entrar com ação civil pública contra escola, pedindo a condenação dela na implementação daquelas medidas que os peritos apontaram como necessárias e, ainda, pode ter que pagar uma indenização pelo dano coletivo”.
Fonte: Cada Minuto (Fábio Atual e Cristina Mendes)