Sinpro diz que educação é negócio

Eduardo Vasconcelos (Foto: Sandro Lima)

Têm sido frequentes as denúncias do Sindicato dos Professores de Alagoas (Sinpro) de maus tratos cometidos por escolas da rede privada a professores. Estes são colocados até para fazer faxina nas escolas, fora os casos de assédio moral que resultam em doenças e depressão, inclusive com tendências suicidas. Para falar sobre essa realidade, a Tribuna Independente conversou com Eduardo Vasconcelos, presidente da entidade. Para ele, a educação virou apenas um negócio e o movimento sindical passa por problemas de representatividade, assim como os partidos políticos.

Tribuna Independente – O Sinpro tem feito uma série de denúncias contra escolas e faculdades privadas por causa de irregularidades nas relações de trabalho. Como está esse quadro em Alagoas, os professores estão sofrendo abusos?

Eduardo Vasconcelos – Como no resto do país, o ensino está mercantilizado. Uma escola hoje, no ensino superior ou no básico, se tornou mercadoria. Um negócio. Todos os problemas inerentes a uma empresa tradicional estão na escola. O aluno é um cliente. Isso gera várias pressões psicológicas, como assédio moral, que por sua vez gera Síndrome de Burnout, pânico ou depressão. Um de nossos grandes méritos foi ter colocado o dedo nessa ferida e mostrar essa realidade, através, por exemplo, do Núcleo de Apoio Psicológico e Psicopedagógico [NAPP]. Contratamos um psicólogo para atender aos professores. Daí nós começamos a perceber que alguns casos são gravíssimos, com tendência suicidas, inclusive.

Tribuna Independente – Esse tipo de trato dos donos das escolas com os professores, em sua avaliação, é para economizar recursos?

Eduardo Vasconcelos – Sim. Tem pouco tempo recebemos uma denúncia, já encaminhada ao Ministério Público do Trabalho [MPT], em que os professores estavam lavando a escola. Sem diminuir o pessoal dos serviços gerais, mas se perceber que a tentativa para otimizar lucro – ou diminuir o prejuízo – faz com que professores estejam fazendo faxina…

Tribuna Independente – Nisso a qualidade do ensino cai consideravelmente…

Eduardo Vasconcelos – Claro. Isso é péssimo para a qualidade do ensino. Tivemos um caso aqui em a professora não tinha formação para lidar com os alunos menores. Hoje a educação privada virou bico, principalmente na periferia. São escolas sem registro. Nem o sindicato patronal tem controle. Para combater essa prática, estamos denunciando esses casos ao Conselho Estadual de Educação, porque são escolas da educação infantil.

Tribuna Independente – O trato com o professor no ensino infantil, na rede particular, é pior do que nos demais níveis?

Eduardo Vasconcelos – Com certeza. Porque geralmente são mulheres e ainda há o preconceito e a vulnerabilidade. São mais suscetíveis à pressão porque só tem aquele emprego. Diferente daqueles que recebem por hora/aula.

Tribuna Independente – Então, o resumo da sua avaliação é de que há uma grande desvalorização do professor na rede privada?

Eduardo Vasconcelos – Total.

Tribuna Independente – Os professores têm procurado o Sindicato para denunciar maus tratos ou estão temerosos em fazer isso?

Eduardo Vasconcelos – Muito. Temos denúncias todos os dias. Aprenderam o caminho. Agora, também vêm donos de escola tentando coagir, ameaçar. Foram abertas várias ações na Justiça contra nós. Já fui parar na delegacia duas vezes…

Tribuna Independente – Por quê?

Eduardo Vasconcelos – Disseram que eu estava difamando a escola. Confundiram o pessoal com o institucional. A luta é essa. Na verdade, estamos mudando uma cultura. E querendo ou não, muitas escolas já começaram a se adequar. De que forma? A gente conseguiu, com o MPT, constituir o Procedimento Promocional [Promo] para as escolas. Isso funciona assim: você vai até as instituições, e aí quem indica somos nós, o Centro de Saúde do Trabalhador [Cerest] é convocado e disponibiliza uma equipe com terapeuta, fonoaudiólogo e engenheiro do trabalho; se faz inspeção em todas as escolas indicadas para ver se as normas de regulamentadoras do MPT estão sendo cumpridas.

Tribuna Independente – E como o sindicato patronal lida com o Sinpro, diante das denúncias que têm sido realizadas?

Eduardo Vasconcelos – No início houve um conflito muito grande, mas hoje algumas escolas que ligadas àquele sindicato concordam com nossas ações. Outras acabaram se adequando e o discurso geral deles é que as que mais cometem irregularidades são a não filiadas e de que esse tipo de postura não é a orientação deles. Logo no início de nossa gestão aqui no Sinpro, as escolas maiores estavam entregues às baratas, com a legislação sendo totalmente desrespeitada: informalidade, atraso de salário, de FGTS [Fundo de Garantia por Tempo de Serviço]…

Tribuna Independente – Mudando um pouco o foco dessa conversa. O senhor preside um sindicato de uma categoria do setor privado, em que pese nossa cultura política, não é muito de se mobilizar, quiçá entrar em greve. Qual a sua avaliação sobre o movimento sindical hoje, no geral e no setor privado?

Eduardo Vasconcelos – Acho que uma das grandes surpresas da última greve geral foi a mobilização dos professores da rede privada. Foi a categoria que mais parou. Tivemos 98% das escolas fechadas, mais que a rede pública. Há cinco anos isso era impensável. Fizemos isso com base na pressão. Gravei um vídeo questionado pela segurança dos alunos, uma vez que as polícias também iriam parar, diminuir efetivo. ‘Quem vai se responsabilizar pela segurança, a escola?’, questionei. Ou seja, os pais pressionaram para que as escolas fechassem.

Tribuna Independente – Mas em relação ao setor privado como um todo, qual sua avaliação da forma como o movimento sindical lida com ele?

Eduardo Vasconcelos – Acho que temos um problema de representatividade. Mas não só no setor privado, mas também os que representam o setor público estão com dificuldades. Você nota pela quantidade de pessoas que vão às assembleias. E quando você percebe as greves puxadas pelas entidades que representam a rede pública, realmente muito poucas têm o respeito da categoria ao de ela seguir, de fato, a orientação política da direção. Fora que muitos servidores públicos são fura-greve, especialmente os comissionados. Seja em banco ou instituição de ensino. Esse problema de representatividade não está só na política partidária, os sindicatos também sofreram processo de desgaste…

Fonte: Tribuna Independente / Carlos Amaral